19.7.03

LEITURAS AOS QUADRADINHOS



Numa destas tardes de sol, passei pela esplanada da Faculdade e a conversa acabou por ir parar aos hábitos (ou à sua ausência…) de leitura dos portugueses em geral e dos estudantes universitários em particular. Não resisti a contar a história de duas colegas de curso (o curso era de Línguas e Literaturas, e este é um dado relevante) que um dia se queixaram à professora de Literatura Portuguesa sobre o excesso de livros que tinham para ler nesse semestre. O “excesso” compunha-se de dois romances e um livro de poesia, se bem me lembro, e ainda de poemas dispersos de diferentes autores e, claro, de alguns artigos e livros teóricos cuja leitura era recomendada. A professora não percebeu a queixa… Uma das alunas explicou, recorrendo a um gesto que não consigo reproduzir (mas que será qualquer coisa como a mão a representar um calhamaço com várias páginas), que antes de entrar para a Faculdade nunca tinha lido “livros destes grandes – aqui entra o gesto – só com letras”, admitindo que os poucos livros que tinha lido no liceu foram substituídos pelos fantásticos resumos da Europa-América. Enfim, a professora esforçou-se para não sucumbir a um ataque cardíaco, alguns colegas olharam para trás com ar chocado (poucos, diga-se) e as queixosas continuaram sentadas, à espera que a aula começasse.
Depois de contar a fatídica história, que conto sempre que vem a propósito o tema das leituras, alguém referiu que havia estudantes que chegavam à Faculdade sem ter lido nada ou quase nada, ou tendo lido apenas “porcarias tipo livros aos quadradinhos”. E pronto, a minha indignação explodiu. Poupo os leitores ao discurso que disparei na altura, mas deixo duas notas breves (que o post já vai longo):
- A Clara Ferreira Alves escreve hoje, no Expresso (rubrica ‘A Pluma Caprichosa'), uma crónica interessantíssima e bastante atenta sobre os hábitos de leitura dos portugueses e a forma descarada como mentem sobre eles;
- Se os milhares de cidadãos portugueses que nunca pegaram num livro desatassem, como que por loucura incontrolável, a ler as aventuras do Corto Maltese, ou do Astérix & companhia, ou do Tintin, só para dar alguns exemplos clássicos e para vários gostos, talvez alguma coisa mudasse nos hábitos culturais cá do burgo, e talvez essa mudança se reflectisse noutras áreas da sociedade e nalguns hábitos do quotidiano. É só uma ideia que eu cá tenho…

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