18.7.07

SEMANA NEGRA - NOTAS DO DIÁRIO

Primeiras impressões
A primeira impressão da Semana Negra é uma espécie de embate inesperado. O espaço é enorme e parece repartir-se entre a venda ambulante (artesanato ‘peruano’ e afins, sempre Made In China, evidentemente), bares de todas as espécies e uma zona que poderia ser a Feira Popular na Feira de Carcavelos. Depois há comes e bebes a perder de vista, 'pulperías' galegas, 'parrilladas', tapas asturianas, os inevitáveis 'kebabs', lulas fritas... Pode beber-se cerveja, sidra, caipirinha, 'calimocho', rum, granizados vários, chocolate quente ou frio... E depois há o espaço central, o coração do evento, onde estão as exposições e as tendas para os debates e onde há dezenas de livrarias, várias organizações não governamentais, muitas organizações de esquerda (as Astúrias mantêm o estatuto de região com tradições nessa vertente), e áreas temáticas que podem ter a ver com o ambiente, com o povo sarahui ou com a promoção da leitura. Há de tudo, para quase todos os gostos.
Não esperava nada de parecido com isto, mas depois de um passeio atento, tenho de dizer que isto é mesmo a Semana Negra, uma mistura consciente e propositada de cultura, divertimento e venda ambulante. Tal e qual como anunciou Paço Ignacio Taibo II, o director da SN, na apresentação do festival: “realizar un festival no culterano, no académico, donde las estrellas anduvieran a pie de calle al alcance del público en general, un festival que mezcla cultura y diversión, entretenimiento y conocimiento identificándolos como parte de una misma experiencia humana, resultaba totalmente novedosa, rompedora y peculiar hace veinte años, pero hoy es la norma en los grandes festivales españoles y europeos.” E foi exactamente isso que encontrei.
Importa registar que todos, repito, todos os eventos onde estive ou por onde passei estavam cheios de gente a assistir. Na sexta à noite, nem a concorrência das dezenas de bares, muitos com música ao vivo, ali mesmo ao lado, impediu que a sala principal da SN estivesse cheia de gente para ouvir Ángel Gonzalez (um dos poucos sobreviventes da geração poética de 50 em Espanha) e Luís García Montero numa sessão de leitura de poemas, muito depois da meia-noite. E não se pense que a grande afluência de gente aos eventos culturais se deve a alguma concentração inusitada de intelectuais e artistas na SN. A assistência tinha tanto de artistas, críticos e jornalistas como de gente de todas as espécies, desde a família que saiu para passear e comer um gelado e aproveitou para conhecer as últimas do romance policial à velhinha solitária que nem lê muito, mas que se predispõe a ouvir poesia lida por poetas e que até segue depois para o espaço onde passam filmes de um realizador obscuro e ainda passa uma boa meia hora vendo Edmund Baudoin a desenhar ao vivo. Se me dissessem que isto era possível, eu desconfiaria; depois destes dias, tornei-me crente.

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